A romantização do estupro em livros da plataforma Wattpad (Artigo)
Apesar de todas as campanhas feitas pela empresa, muitos usuários ainda abordam o tema de modo romântico e sem apontar a gravidade do tema.
Em uma sociedade onde tudo o que é feminino vira motivo para escárnio, o estupro ser tido como “fetiche” não surpreende. Em outras mentes, é mesmo uma “punição” para aquela mulher que “não deveria ser vestir de modo tão vulgar”, “não deveria estar naquela rua à noite” ou “deve servir como boneca inflável para os homens”. No Wattpad, infelizmente, as duas correntes se unem em forma de obras que romantizam o tema.
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Não faça isso. Você pode até ter poucos leitores; você pode ter milhares deles ou nenhum, não importa: no momento em que você vai para a arena pública que é a internet, você precisa ter responsabilidade social; você precisa ter consciência de que os teus atos podem incomodar, influenciar e machucar.
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Você precisa ter empatia.
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Quando você romantiza um tema como esse você está, sim, contribuindo para fortalecer a cultura do estupro que temos no Brasil. Você está dizendo para alguém que foi estuprado que aquilo poderia ter algo de bom e, Oh, que lindo!, eu poderia até ter me apaixonado pelo meu estuprador e vivido uma tórrida história de amor com ele…
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Definitivamente, não!
Como eu já falei por aqui, escrever é um ato político. Portanto, de nada adianta você reclamar do Presidente da República quando ele afirma que alguém “não merece ser estuprada”, enquanto no Wattpad você transforma ato tão repugnante no mote de um romance cheio de fofura.
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Vai escrever sobre estupro?
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1) Indigne-se; ponha-se no lugar da vítima;
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2) Leia relatos, sinta a dor, busque a chaga que fica na alma de alguém que já passou por isso;
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3) Deixe o erro em evidência e não o transforme em fetiche;
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4) Não recompense o estuprador. Há redenção? Há, é clara que sim. Porém, dependendo do modo como você fizer isso, pode parecer que ele recebeu um prêmio. Deixe claro que há punição e punição SEVERA;
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5) O cara inventado por você pode ter a famigerada aparência de um príncipe de contos de fadas, não importa: ele ainda é um ESTUPRADOR;
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6) Não culpe a vítima. Não há NADA que justifique um estupro;
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7) Use tua história como manifesto e grite. Faça da tua escrita uma forma de impulsionar o grito daqueles que não têm ou não tiveram coragem de denunciar o estupro sofrido;
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8) Aponte o essencial tão dito pelos movimentos feministas, mas que principalmente nós, homens, ignoramos: “meu corpo, minhas regras”. Deixe isso bem claro na tua história. Defenda essa posição. Lute por ela.
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E o essencial: escritor, escritora, use a tua escrita como barco de salvação, não como arma em prol do machismo. Empunhe a bandeira pelo respeito.